Hoje muito se tem falado em impunidade. A sociedade brasileira encontra-se num caos devido, em parte, à impunidade. As leis não podem ser cumpridas porque sempre há uma brecha que as tornam inoperantes, ou consegue-se uma maneira de burlá-las.
A sociedade tem tentado encontrar uma solução ou encontrar as causas. Tanto as causas como as soluções são inúmeras e complexas, mas podemos ir olhando para cada uma delas e incentivar que cada um faça a sua parte.
Hoje gostaria de falar a nós, pais, que somos os que mais tememos pela segurança de nossos filhos, sejam eles crianças ou adolescentes. Qual é a nossa fatia? Onde podemos rever os padrões educacionais?
Um aspecto que tenho observado na sociedade, nas pessoas com quem convivo e nos meus pacientes é a dificuldade, de muitos pais, em impor limites aos filhos. Colocar limites, dizer “não”, não é castigar ou punir. É educar.
Nossa geração de pais foi criada pensando que reprimir era “feio”, era tolher a liberdade, era antidemocrático. Além disto, estamos nas primeiras gerações de mães que trabalham fora o dia todo, numa sociedade deveras individualista, onde muitas crianças estão sendo deixadas de lado do ponto de vista emocional. As crianças têm aulas de inglês, de computação, esportes, internet, TV a cabo...
Mesmo assim, os pais se sentem culpados com a falta de atenção e, procuram compensar, não frustrando seus filhos ou colocando limites. Ou colocar limites seria mais uma tarefa para pais cansados da rotina pesada do trabalho diário?
Seja qual for o caso, colocar limites é ajudar a criança e o adolescente a reprimir os impulsos que são indesejados na sociedade, geralmente os agressivos e os sexuais. Estes impulsos só devem se manifestar de maneira adequada a cada cultura. Caso contrário, encontraremos as perversões, a criminalidade e os diversos desajustes sociais.
Toda sociedade humana só pode desenvolver-se se embasando na repressão destes impulsos, e podendo transformá-los em produção simbólica, em criatividade, em trabalho. Se todos pudessem transformar sua agressividade em “garras”, não para machucar alguém, mas “garras” para o trabalho, para lutar por uma sociedade melhor!
Sei que é muito difícil colocar limites nos filhos já que vivemos em uma sociedade que não quer deixar lugar para a frustração. Se quero falar com alguém, não espero nem um minuto, pego meu celular. Se quero mandar uma mensagem para alguém do outro lado do mundo, é só mandar um e-mail. Se sinto que posso ter uma dor, é só tomar um analgésico. Se quero uma comida diferente, exótica, é só discar a tele-entrega. Se um jovem quer experimentar “ficar” com alguém, fica com quantos quiser, em uma única noite, sem consequências maiores.
São inúmeras as facilidades que temos, e gosto delas, diga-se de passagem. Podemos usá-las para nos trazerem benefícios inimagináveis. No entanto, podem fazer-nos sentir onipotentes, seres que tudo podem e que nada pode nos frustrar. Nem mesmo o bem estar dos outros e da sociedade, muito menos as leis.
É fácil dizer para os pais educarem seus filhos para não se tornarem futuros marginais. É só dar limites, nem de mais e nem de menos. De mais pode revoltá-los e deixá-los agressivos; de menos pode deixá-los onipotentes ao ponto de contarem com a impunidade e fazerem o que bem quiserem.
É, não é tão fácil assim. Ainda mais que cada uma das crianças tem uma necessidade diferente e os pais ainda, ao chegarem em casa cansados, devem ter a sensibilidade de sentir o que cada um dos filhos está necessitando naquele momento. Se de ternura, se de limites, se endurecer , mas sem perder a ternura.
É, não é fácil, mas vale a pena tentar. Esta é a parte que nos cabe como pais. Se estiver difícil, pedimos ajuda a um profissional. Esta é outra facilidade da vida moderna, temos especialistas em todas as áreas.
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